sexta-feira, 16 de novembro de 2007

Fellini - Amor Louco
***A Quietude é Quase um Sonho***



Fiquei anos da minha vida à procura de um amor louco. Ouvia muito falar do dito cujo, mas não sabia bem o que era. Diziam que era maravilhoso, que depois dele eu nunca mais seria o mesmo. E eu até acreditava que fosse mesmo verdade, dadas tantas informações que me passavam acerca do assunto.

Fato é que enfim consegui encontrá-lo. Depois de uma busca incessante, pelas mãos de Jair Marcos, guitarrista da banda paulistana Fellini, adquiri meu exemplar do álbum Amor Louco, lançado pela banda em 1989. Mal sabia o "mal" que me faria.

O Fellini é uma das bandas mais inventivas do cenário musical brasileiro. Sua pequena obra, infelizmente não conhecida por muitos, influenciou diversas bandas e músicos dos anos 80 e 90, tanto pela sonoridade que mescla elementos de rock com samba, pós-punk e new wave, quanto pela forma independente como administravam sua carreira. As gravações feitas em 4 canais não ofuscavam o brilho das canções. Amor Louco foi produzido em melhores condições, gravado em 16 canais.

Mas voltemos ao foco. Árdua batalha vencida, o disco estava em minhas mãos. E Chico Buarque Song me fazia a cabeça, me deixava feliz. Eu amo Chico Buarque. Ela acha que ele é um ótimo poeta, mas canta mal pacas. Tudo bem, tudo certo. Mesmo que eu achasse que ele canta mal, talvez ainda assim gostasse. Algumas vezes a voz sobrepõe às palavras, outras, o contrário.

O clima do disco é acústico, clima de lual em volta da fogueira, com arranjos muitas vezes psicoacústicos e letras meticulosamente escritas em sua maioria por Cadão Volpato e Thomas Pappon. Aliás, o Fellini se desdobrou em muitos outros projetos musicais, também não tão conhecidos como deveriam: The Gilbertos, Funziona Senza Vapore, Cadão Volpato, 3 Hombres, todos de imensa poesia um tanto surrealista e hermeticamente pop. Chico Science, expoente-mor da música brasileira dos anos 90, era admirador do Fellini e gravou com a Nação Zumbi a música Criança de Domingo, do projeto Funziona Senza Vapore, no disco Afrociberdelia.

Na realidade, muito mais do que qualquer artista, o que mais me influenciou a procurar conhecer o Fellini foi a coluna 02 Neurônio da folha de São Paulo. As meninas da coluna viviam escrevendo que as mulheres sonhavam em encontrar um pretê (pretendente) que baixasse a tampa do vaso sanitário, que abrisse a porta do carro e que gostasse da banda Fellini.

Aí pensei: Baixar a tampa do vaso eu já baixo, carro ainda não tenho, então vou conhecer o Fellini porque aí minhas chances de conhecer alguém legal irão aumentar. Grandes ilusões.

Desta vez não quero falar sobre as músicas, mas conhecer o Fellini fez a diferença. Por causa do Fellini conheci um monte de outras bandas, descobri o diretor de cinema de onde a banda tirou o nome e conheci um monte de outras pessoas. Prefiro que cada um procure o seu Amor Louco. Assim como na vida, o Amor Louco é raríssimo, então caso você o encontre, agarre com todas as forças. Este Amor Louco que nos faz cantar desafinado, aprender a tocar violão, dormir fora de casa, este é quase impossível de se encontrar.

Existem 2 Amores Loucos. O primeiro é o do disco do Fellini, o outro é aquele que encontramos na obra de Carlos Drummond Andrade. Foi difícil, mas já encontrei os dois.

“Cidade perdida
Joga as cascas pra lá
Só eu e Você e o amor louco

Cidade proibida
Fácil vem, fácil vai
Só eu e Você e o amor louco.”



Conheça mais sobre a banda:
http://www.myspace.com/fellinivive


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quinta-feira, 8 de novembro de 2007

Pato Fu - Daqui Pro Futuro
***A vida é como um gás...**


Poucas bandas no cenário musical brasileiro, e quiçá mundial, podem causar inveja por possuir uma obra irrepreensível. A banda mineira Pato Fu, que lançou seu primeiro trabalho, Rotomusic de Liquidificapum (1993), e no ano de 2007 deu ao mundo Daqui pro Futuro, é uma delas.

Um amigo fez uma observação interessante: as músicas do Pato Fu, além de soarem sempre originais, nunca soam deslocadas. Não é o que vemos acontecer com outras bandas, que ao lançarem um novo disco, temos em muitos casos a impressão de que as músicas são sobras do disco anterior. O Pato Fu está sempre a diante, mas mesmo assim, qualquer canção do álbum Gol de Quem? (1994) poderia estar em Isopor (1999), ou qualquer faixa de Televisão de Cachorro (1998) entraria facilmente em Toda Cura Para Todo Mal (2005). A mesma singularidade das canções acompanha a pluralidade da obra desta que no ano de 2003 foi considerada uma das 10 melhores bandas do mundo pela Revista Time, ao lado de gigantes como U2 e Radiohead.

Daqui pro Futuro segue a mesma linha criativa contínua criada pela banda, mas como um outro amigo observou, este disco está menos para John e mais para Fernanda. O lado experimental da banda deu espaço para harmonias mais simples e enxutas, com os efeitos eletrônicos menos aparentes e Lulu Camargo desenvolvendo um excelente trabalho com pianos e teclados.
Muitos disseram que a banda desacelerou depois do nascimento de Nina, filha de John Ulhoa e Fernanda Takai, e que a banda fez um disco em sua homenagem, o que não é necessariamente verdade. Toda Cura Para Todo Mal, foi completado durante a gestação de Nina, e nem por isso é um disco calmo. O que acontece é que como de costume o Pato Fu se aventurou mais uma vez em criar algo de inusitado em sua obra, e conseguiram, criando muito mais baladas pop do que músicas para pular e dançar.

E realmente o disco abre calmo com 30.000 pés, que já é pra iniciar com espírito de liberdade.

A única canção realmente feita em homenagem à Nina é Mamã Papá, mas os versos “conte sua história pois sua memória pode um dia se apagar” servem para qualquer um de nós, sendo pais, mães, filhos, avós...

A melancolia é mantida em Espero, outra balada a lá Pato Fu, com vocais de John ao fundo.

Cities in Dust, cover do maior sucesso da banda de pós-punk inglesa Siouxsie and The Banshees, presente no disco Tinderbox de 1986, é a homenagem do álbum, já que geralmente o Pato Fu inclui alguma versão de outro artista em seus trabalhos. É uma boa cover, mas não atinge o status de versão por ser bastante parecida com a música original.

Tudo Vai Ficar Bem tem um dueto de Fernanda Takai com Andrea Echeverri, vocalista da banda colombiana Aterciopelados, e é uma das melhores faixas do disco, também por conta das guitarras e bateria um pouco mais pesados.

Como a banda possui inúmeras referências, fizeram uma interpretação bem pessoal em A Hora da Estrela, criando uma ponte entre a busca pela felicidade vivida por Macabéa, do livro homônimo de Clarice Lispector, e a busca por sucesso a qualquer custo.

Tida com um hino gay, Woo! trata de um grito de liberdade muito mais amplo, algo como o antigo sucesso de Raul Seixas que dizia “Faça o que tu queres, há de ser tudo da lei”.

Vem A Verdade Sobre o Tempo, e para entender esta é preciso sentir as palavras: “...a vida é muito mais que os dias, que os deuses, que jornais...”

E ainda tem Quem Não Sou, que pode ser considerada a mais experimental do disco, mas simplesmente pelos efeitos de distorção das vozes, levada minimalista sons menos orgânicos.

Vagalume é uma música daquelas que costumeiramente chamamos de “fofas” e que de hoje em diante será tocada em diversos luais.

A melhor faixa do disco, Nada Original, acerta no título, pois não trás nada de diferente do que o Pato Fu tenha feito até aqui, mas mostra a competência da banda em compor belas canções, com grandes letras e fugindo sempre de temas óbvios.

O disco fecha com 1000 Guilhotinas, mas uma canção light, um clima que mistura futurismo com idade média. É uma boa canção estranha.

Ao final do disco, a impressão que tenho é que o ele remente sempre ao tema de liberdade, seja a liberdade de nascer e morrer, de criar asas e voar, ou até mesmo da falta de liberdade.
Mas o que salta aos olhos e ouvidos é a produção impecável do disco. O projeto gráfico de Conrado Almada é primoroso, e a produção musical mais uma vez assinada por John, mostra que além de ser um dos melhores guitarristas e compositores do país, também consagrou-se com um dos maiores produtores da atualidade, e tem liberdade para fazer o que quiser no estúdio 128japs, que mantém em sua casa, e de onde consegue tirar os timbres mais eficazes de todos os instrumentos.

Não é o melhor trabalho da banda, que sempre mantém a regularidade da qualidade de seus discos, mas é com toda a segurança um dos melhores lançamentos do ano de 2007.

E daqui pro futuro vamos esperar pra ver o que acontece.


Conheça mais sobre a banda:

http://www.patofu.com.br

http://www.myspace.com/patofu


quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Autoramas - Teletransporte
***Surte, e daí?***



A banda carioca Autoramas criou em seu mais recente disco – Teletransporte (2007) – um legado de canções que representam as dificuldades e frustrações da sociedade moderna. Dificuldades? Frustrações? –“Lá vem mais um daqueles disquinhos deprês!”.
Muito pelo contrário. Os Autoramas fizeram isto com simplicidade, criatividade e muito bom humor.

Neste disco a formação conta com Gabriel Thomaz (guitarras e vocais), Selma Vieira (baixo e vocais) e Bacalhau (bateria), e têm nas letras sarcásticas e inteligentes do também principal compositor da banda, Gabriel, um dos seus maiores trunfos.

Nos trabalhos anteriores, Stress, Depressão e Síndrome do Pânico (2000), Vida Real (2001) e Nada Pode Parar os Autoramas (2003), o que dava o tom era a mistura surf music + jovem guarda, o que não ocorre em Teletransporte. A produção de Kassin e Berna deixou o disco mais pop, no bom sentido que a palavra carrega. A maioria das músicas poderiam tocar em rádios FM e melhorar a qualidade da programação já escassa de bons grupos, tudo isso, é claro, caso não houvesse a Lei do Jabá. O baixo, que antes era alto e distorcido, agora é mais contido, e a banda muitas vezes soa mais guitar do que surf music. Como eles nunca se nomearam como uma banda de surf, isso não representa efetivamente um problema.

O disco abre com a dobradinha Mundo Moderno e Fazer Acontecer. A primeira com a levada mais rock, e a segunda, com a guitarra fazendo as vezes de um efeito eletrônico. A primeira com a letra reclamando da prisão que a grande quantidade de novidades pode criar, enquanto a segunda versa sobre o poder de se tomar as rédias das situações, o que neste caso, pode servir tanto para alguém que joga o lixo no lugar correto, quanto para um CEO de uma grande corporação, e as milhares de decisões que tem de tomar diariamente.

A 300 Km/h é tida por Gabriel Thomaz como a melhor canção que já compôs. Seu ritmo é calmo, típico de bailes daqueles para dançar de rosto colado. E quem não se rende aos versos “Eu estou a 300Km/h na sua direção, sem freio...”?

Marketeiro é um sátira sobre artistas que se deixam moldar para atender às expectativas do público. Não há nada mais atual do que isso, não é verdade?

Entra em seguida Hotel Cervantes, uma surf music desacelerada sobre amores, urgências e tranqüilidade.

A próxima, Já Cansei de Te Ouvir Falar, com os vocais divididos com a ótima baixista Selma Vieira, também possui uma levada rock, e fala sobre um relacionamento mal resolvido, e da peleja em buscar alguém fora dos padrões convencionais.

Identificação mostra os Autoramas misturando Roberto Carlos com Freud. A música lembra muitas canções da jovem guarda, e a letra, alguém que se conheceu melhor por ter ódio de si, e que se decepciona ao perceber que não é a pessoa que realmente queria ser. Colada em Identificação vem Surtei, pesada e declamando um hino sobre stress.

Conseguem também mostrar que nem só de peso vivo o homem, e Eu Mereço conta a história de alguém que se expôs demais, e juntamente com a próxima, Muito Mais, mostram a superficialidade das relações humanas. E isso acontece de verdade? Claro que não. Big Brothers estão aí para provar o contrário.

Digoró, uma versão de uma banda brasiliense chamada Radical Sem Dó é fora de série. Instrumental esquizofrênico e letra viajante que envolve meninos drogados, um seqüestro de naves de fliperama e explosões. É ficção científica lado b psicótica.

O disco fecha com Panair do Brasil, uma balada instrumental em “homenagem” à crise aérea brasileira, que pode servir para relaxar diante das horas de atraso enfrentadas nos aeroportos, seguida de O Inesperado, com título auto-explicativo, e por último, Guitarrada, outra instrumental em homenagem ao gênero musical paraense que mistura choro, carimbó e jovem guarda.

Enfim, um disco que trata de crises amorosas e aéreas, falta de tempo, medos, stress, exposição pessoal e todas essas mazelas do mundo moderno, mas que no final te deixará feliz e você esquecerá de tudo isso, inclusive do que leu agora.


A banda disponibilizou todos os discos lançados até agora para download gratuito. Faça o download dos discos Stress, Depressão e Síndrome do Pânico, Vida Real, Nada Pode Parar os Autoramas, Teletransporte e algumas raridades no link abaixo:
http://www.tramavirtual.com.br/autoramas

Conheça mais sobre a banda:
http://autoramas.uol.com.br

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